terça-feira, 2 de novembro de 2010

O enfrentamento

Meu pai Manoelino e minha mãe Enildete, são primos próximos, ambos viviam no interior do estado do Pará, e interior, entende-se sem energia, tv, internet, estradas, e até mesmo motores para locomoção em embarcações, um povo sofrido onde seu futuro dependiam de duas coisas: trabalho e honestidade, essas eram moedas correntes da época. Destacavam-se os homens que eram honestos, onde nem sempre posses significariam honrar seus compromissos e a fama andava longe.
Meu pai estava praticamente as vésperas de namorar uma outra moça quando conheceu minha mãe, ela perdido a mãe aos 8 anos de idade e como na época era tradição que as filhas mais velhas cuidassem das mais novas em caso de morte da mãe, o que era o caso, minha mãe conta que morou com sua irmã Nadir, uma mulher letrada casada com um fazendeiro trabalhador onde tinha que ajudar nos trabalhos domésticos, lá chegou a cozinhar para 40 homens. Ele (papai) com fama de honesto, conhecido no Igarapé dos Currais como homem de coragem, onde jamais se viu uma mentira, ou se quer, não cumprir com suas obrigações, muito dedicado aos seus pais. Meu avô não tinha a quarta série, no entanto possuía uma letra de dar inveja a qualquer letrado, educado e bondoso era conhecido por suas famosas selas chamada: "Selas Mário Lobo".
Após o casamento, meus pais foram morar numa fazenda chamada Aliança, pequeno paraíso, onde na época era cercada de mata com um caminho estreito em direção ao lago Piraruacá ( Pira = peixe; Oca = casa; casa de peixes), uma casa modesta de palafita ( modelo de casas construídas sobre terrenos que recebem águas em períodos do ano, que no caso, chamamos de cheia), contruida em uma ponta de praia de água doce e negra que ao sabor dos ventos erguiam cristas de marolas brancas onde lentamente se desfaziam na praia branca da propriedade, o cheiro típico de frutas peculiares da região aromatizavam o lugar, e faziam deste pedaço de chão fecundo e acolhedor para o início de uma história.
Do enlace, nasceram neste lugar 4 filhos: Rildo, Rosemere, Amilcar e Gilson, todos descrevem com saudosismo os momentos de infância, onde não iam para as aulas de inglês, judo, ou creches, jantavam pontualmente as 18h da tarde e conversavam sobre o dia. Aos nove anos de idade meu irmão Rildo já lia os Gibis que meu pai trazia da cidade próxima (Terra Santa), além do que, tinha praticamente lido toda a bíblía, seu Manoelino compreendeu, precisava investir nos estudos de um menino que não se conformava com a sorte de permanecer ali, casar e construir uma casa ao lado ( como era costume).
Meus avós, possuíam uma casa em Terra Santa e para lá os quatro foram estudar. Gilson conta do susto levado ao se deparar com um caminhão alemão da época que cruzava a rua , o mesmo saiu disparado pelos quintais da vizinhança com medo de tal assombro. O estudo restrito, levou meu pai a tomar uma outra atitude, enviá-los a Parintins, e dessa vez minha mãe foi com eles.
Alugaram uma casa na Rua 31 de Março, coincidência ou não data de seu aniversário. Meu pai ficou na Aliança, tinha uma venda, espécie de mercadinho, e de lá extraía condições para manutenção dos estudos de seus filhos. Rildo percebendo as condições de seu pai, resolveu entrar no seminário para seguir os estudos e torna-se padre, o que foi um choque para meu pai. Dois anos depois, o superior do Seminário informa que Rildo não seguiria com o dom.
Ao sair do retiro, meu irmão decide rumar a Manaus, objetivo: estudar para o vestibular, problemas: não conhecia ninguém, meu pai não tinha como o manter em uma casa, no entanto, ele conheceu um padre no seminário que lhe deu abrigo nos primeiros dias de sua estada na capital do Amazonas. Após a acolhida na casa de um amigo de meu pai, a notícia de que Rildo não tinha futuro ( segundo esse"amigo"de meu pai) o deixou preocupado. Em absoluto, Rildo estudava obstinadamente, e 1 ano, 1983, foi aprovado em 14* lugar no curso de medicina. Entenda, viviam numa época mágica, ser médico era ter fé pública, era ser admirado, jamais passava até mesmo na cabeça de meu pai que um menino do Igarapé dos Currais passaria no Vestibular, o tempo, o som, e até mesmo a luz paralisaram para Manoelino ao ter a notícia que seu filho mais velho seria um médico. Inacreditável.
Por isso, Rildo recebeu minha homenagem na postagem denominada: A saga. Trata-se do iniciador de uma trajetória, pois, se ele conseguiu, nós também poderíamos. Ele me conta que mamãe estava grávida de mim de aproximadamente 7 meses quando o reencontrou, e não titubeou, carregou o prodígio no colo não atentando para sua condição de tanta felicidade.
No ano de 2002 morava com Rildo, como disse em postagens passadas, Gilson havia me convidado para morar, estava retornando de sua especialização em oftalmologia em São Paulo. O natal desse ano, passamos na fazenda onde nasceram, agora mais cuidada, uma nova casa toda avarandada construída com madeira de lei no exato lugar da antiga. Meu cunhado: Cândido, com meus sobrinhos: Tales e Thaís trouxeram um cajueiro, e plantaram no mesmo lugar do que havia, ele teria sido morto pelas cheias constantes que assolaram o lugar. Não entendia o motivo de nos locomovermos de Manaus até a fazenda, onde a logística era complicada e enfrentávamos 6 horas de barco, 40 min de estrada, e aproximadamente 1 hora de barco para chegar na Aliança.
Aquele natal foi mágico, meu pai, já adoecido com a polieuropatia que até então era idiopática. Todos estavam lá, contamos histórias até altas horas da noite, ceamos, e morríamos de rir com as piadas de meu pai que contava do quarto final da casa. Mesmo doente, parecia imbatível, inabalável.
No dia seguinte, nos despidimos de nossos pais e deixamos a casa vazia. Ao chegar em Manaus em pouco tempo mudei para onde meu irmão iria morar, e no dia 09 de Janeiro de 2003 tive uma conversa inesquecível com meu irmão Gilson.
Ele me perguntou se eu realmente queria fazer medicina, se sabia que ao abraçar a profissão não teria feriado, dia santo, muito menos deixaria de ser médico ao retornar para minha casa, um pouco assustado respondi: mesmo assim desejo ser médico. Ele retrucou: pense melhor, amanhã me responda.
Dormi assustado e pensativo. No dia seguinte no café, já o avisei, sim é isso que quero. Ao retornar do trabalho, montamos um cronograma e uma estratégia de estudos, não frequentaria cursinho, pois, tinha o material a disposição em casa, fruto do terceiro ano do segundo grau que estudei nos Colégios Objetivo. Isso me deixou preocupado, no entanto, chamei a responsabilidade para minhas costas, e o fracasso ou a vitória dependeria apenas de mim.
Segui o cronograma rígido, tinha horário para tudo, inclusive para frequentar a academia, das 18:30 as 19:30, quando chegávamos ele dormia, e eu ficava até meia noite estudando. Meu fim de semana restringia-se a um sábado a tarde, pois pela manhã era dedicado a redação.
Chorava quase todas as noites a ver carnaval, aniversários, e outros eventos passarem sem minha presença. Entrei no que podemos chamar de retiro intelectual. Essa rotina pesada só foi quebrada em duas ou três vezes as quais ou fomos a casa de Amarildo ( amigo irmão de Gilson) ou a um Show de Nilson Chaves que recebi como um presente. E as coisas não pararam por aí...

Fazenda Aliança nos dias Atuais.

3 comentários:

  1. Noossa.. tá mais linda ainda!!! Como pode?? Lindo esse lugar! Inesquecível! Que saudade, que vontade de voltar aí! Linda a história da sua família!! Abraços de Luana Viana

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  2. Lua, vi as fotos do casamento, meus parabéns...Gostaria que vc compartilha-se comigo o seguimento deste blog. A Aliança esta linda, e quando quiser ir está de braços abertos...Beijo

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  3. nossa como fico feliz em saber que eles creceram e evoluiram, conheço o Gilson e o Rildo a muito tempo, mas nao tenho contato com eles, manda um abraço a eles, sou prima da Eucilene texeira me chamo angela seixas. fala pra ele que ainda lembro do carro velho que dava sempre prego quando eles apareciam na casa da Edilena nos fim de semana em manaus kkkkk beijos

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